quarta-feira, 23 de maio de 2012

Condutas vedadas: e-mail funcional

Condutas vedadas
Condutas vedadas aos agentes públicos em campanha eleitoral são os comportamentos previstos no artigo 73 da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97). Constituem-se em espécie do gênero abuso de autoridade.
Essas normas visam impedir a utilização da máquina administrativa para beneficiar uma candidatura em detrimento das demais. Buscam preservar a isonomia entre os candidatos e a probidade administrativa.
A tutela da igualdade de oportunidades - ou de chances - entre candidatos e partidos nas campanhas de que participarem procura impedir o desequilíbrio patrocinado com recursos públicos.
A prática das condutas descritas nos dispositivos mencionados, por presunção legal, afeta a igualdade de oportunidades entre candidatos, independentemente de sua repercussão.
A lei eleitoral prevê como sanção a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e multa no valor de cinco a cem mil UFIR, sendo estas aplicáveis aos agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas e aos partidos, coligações e candidatos que delas se beneficiarem.
A prática das condutas descritas no art. 73 e, ainda, a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, sujeitam o candidato beneficiado, agente público ou não, à cassação do registro ou do diploma.
A jurisprudência eleitoral tem admitido, no entanto, aplicação do princípio da proporcionalidade quando da fixação da sanção.
No título das condutas vedadas também consta (Art. 77) a proibição de candidato comparecer, nos 3 (três) meses que precedem o pleito, a inaugurações de obras públicas, conduta esta sancionada com cassação do registro ou do diploma.

Peculiaridades processuais
Uma vez praticada alguma das condutas vedadas, é cabível a propositura de representação, que poderá ser ajuizada até a data da diplomação.
Essas representações podem ser manejadas por qualquer partido político, coligação ou candidato, e devem dirigir-se aos Juízes Eleitorais, nas eleições municipais; aos Tribunais Regionais Eleitorais, nas eleições federais, estaduais e distritais; e ao Tribunal Superior Eleitoral, na eleição presidencial.
O prazo de recurso contra decisões proferidas será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial.
Um mesmo comportamento pode ser caracterizado como conduta vedada e abuso de poder político. Nesse sentido:
“[...] 4. As condutas vedadas no art. 73 da Lei no 9.504/97 podem vir a caracterizar, ainda, o abuso do poder político, a ser apurado na forma do art. 22 da Lei Complementar no 64/90, devendo ser levadas em conta as circunstâncias, como o número de vezes e o modo em que praticadas e a quantidade de eleitores atingidos, para se verificar se os fatos têm potencialidade para repercutir no resultado da eleição. 5. O uso da máquina administrativa, não em benefício da população, mas em prol de determinada candidatura, reveste-se de patente ilegalidade, caracterizando abuso do poder político, na medida em que compromete a legitimidade e normalidade da eleição. [...]” (Ac. no 21.167, de 21.8.2003, rel. Min. Fernando Neves.)

E-mail
Image: Stuart Miles / FreeDigitalPhotos.net 
Um caso interessante foi julgado recentemente pelo Tribunal Superior Eleitoral: tratava-se de servidora pública municipal que utilizou seu e-mail funcional para distribuir propaganda eleitoral para 71 (setenta e uma) pessoas em favor de candidata à presidência da República.
Essa situação atrai a aplicação dos dispositivos da Lei das Eleições:

Art. 73
São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
I - ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária;
II - usar materiais ou serviços, custeados pelos Governos ou Casas Legislativas, que excedam as prerrogativas consignadas nos regimentos e normas dos órgãos que integram; [...]
§ 4º O descumprimento do disposto neste artigo acarretará a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa no valor de cinco a cem mil UFIR.
§ 5° Nos casos de descumprimento do disposto nos incisos do caput e no § 10, sem prejuízo do disposto no § 4º, o candidato beneficiado, agente público ou não, ficará sujeito à cassação do registro ou do diploma. [...]
§ 8º Aplicam-se as sanções do § 4º aos agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas e aos partidos, coligações e candidatos que delas se beneficiarem.

Essa ação foi de competência originária do TSE, visto que candidata à Presidência era parte legítima, pois, ao menos em tese, foi beneficiada pela conduta vedada praticada.
Foi reconhecida a prática da conduta vedada prevista na Lei nº 9.504197 em razão da utilização do e-mail funcional para difusão de propaganda eleitoral.
Considerou-se a prática de um ato isolado no contexto da eleição presidencial, já que este teve seu alcance restrito a 71 (setenta e uma) pessoas próximas à servidora, para fixar-lhe a multa de 5 mil UFIR.
Segundo a jurisprudência do TSE, os beneficiários da conduta vedada são punidos mesmo que não tenham conhecimento de sua prática.
Se considerou a situação excepcionalíssima examinada, já que se decidiu que - no contexto de uma eleição presidencial brasileira, com mais de 135.000.000 (cento e trinta e cinco milhões) de eleitores - uma conduta isolada sem qualquer repercussão em âmbito nacional não deve interferir na esfera jurídica do candidato. Foi então afastada a sanção à candidata.
Segundo a relatora do acórdão,
“Entendimento diverso poderia possibilitar que qualquer pessoa isoladamente, por meio de um único ato sem repercussão no contexto da campanha presidencial, supostamente beneficie um candidato à presidência da República para, na prática, prejudicá-lo judicialmente”.
Veja a ementa:
RECURSO. REPRESENTAÇÃO. ELEIÇÕES 2010. CANDIDATURA À PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. CONDUTA VEDADA. PRAZO PARA AJUIZAMENTO. ART. 73, § 12. ART. 73, I, DA LEI 9.504/97. UTILIZAÇÃO DE BENS PÚBLICOS EM PROL DE CANDIDATO. CONFIGURAÇÃO, INDEPENDENTEMENTE DA POTENCIALIDADE. PROPORCIONALIDADE NA FIXAÇÃO DA SANÇÃO. ART. 73, § 8º, DA LEI 9.504/97.
1. Com o advento da Lei 12.034/2009, o prazo para o ajuizamento das representações fundamentadas na prática de condutas vedadas estende-se até a diplomação dos eleitos, nos termos do art. 73, § 12, da Lei 12.034/2009.
2. A configuração das condutas vedadas aos agentes públicos ocorre com a mera prática de uma das hipóteses mencionadas no art. 73 da Lei 9.504/97, independentemente da potencialidade lesiva de influenciar o resultado do pleito, já que há presunção legal de que a prática dessas condutas tende a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais, independentemente de sua repercussão. Precedentes.
3. Na espécie, servidora pública municipal enviou 71 (setenta e uma) correspondências eletrônicas por meio de seu correio eletrônico funcional, divulgando mensagem em favor da então candidata à Presidência da República Dilma Rousseff.
4. A despeito de ser beneficiária da conduta, a representada Dilma Rousseff não deve ser sancionada, considerado o contexto da eleição presidencial brasileira.
5. Recurso provido para conhecer da representação e julgá-la parcialmente procedente, com aplicação de multa no mínimo legal à responsável pela prática da conduta.
(Recurso em Representação nº 425109, Acórdão de 21/03/2012, Relator(a) Min. FÁTIMA NANCY ANDRIGHI, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 077, Data 25/04/2012, Página 14-15 )

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